As pessoas usam diferentes palavras para descrever ou ilustrar o conceito, atribuindo assim um significado bastante subjetivo ao termo – porém deve (ou deveria) existir um entendimento comum, um território no qual possamos dialogar sobre o assunto.
Nesse sentido, muitos esforços já foram feitos para tentar conceituar o que é, afinal, saúde. E hoje, Dia Mundial da Saúde, pode ser um bom momento para retomarmos essa reflexão.
O que significa, para você, ter saúde? Já pensou nisso antes? Se já, é bem possível que isso tenha acontecido em um momento de doença. Afinal, damos mais valor a algo quando aquilo nos falta.
Me lembro bem de quando rompi o ligamento cruzado anterior do meu joelho esquerdo, devido ao início tardio de uma carreira (nada promissora) de skatista. Passei várias semanas pensando sobre a falta que um joelho nos faz.
Fui a diversos ortopedistas até encontrar um que me desse o conselho que queria escutar: “não faça a cirurgia”. Dez anos se passaram e hoje meu joelho funciona perfeitamente bem.
Saúde muito mais do que ausência de doenças
Podemos partir dessa memória pessoal bastante dolorosa para ilustrar um entendimento peculiar do conceito de saúde: ausência de doença, visão particularmente defendida por um filósofo chamado Christopher Boorse, em 1975.
Trata-se de um conceito negativo, ou seja, não explicaria por si só o que seria saúde, mas pondera que ela existiria somente em função da não-doença.
Na prática, implicaria em considerar saudável uma pessoa com câncer, desde que não apresente sintomas nem tenha recebido ainda diagnóstico. Parece razoável?
Décadas antes, a Organização Mundial de Saúde (OMS) já havia proposto um conceito positivo, que buscou ampliar o entendimento dos fatores que interferem na saúde das pessoas. A saúde seria, de acordo com essa visão, o “completo bem-estar físico, mental e social“.
Essa interpretação, criada no contexto do fim da Segunda Guerra Mundial, avançou incrivelmente ao considerar elementos como alimentação, saúde mental, acesso ao sistema de saúde e contexto social.
É uma visão adotada pela instituição até os dias de hoje – porém também sofre uma série de críticas ao tratar a saúde como uma espécie de utopia, um estado inatingível de completo bem-estar. De acordo com esse conceito, a maioria dos seres humanos não poderia ser considerada saudável, não é mesmo? Você seria?
Em 1984, o Escritório Regional Europeu da OMS revisitou a discussão e trouxe um novo entendimento. De acordo com a Carta de Ottawa, importante documento resultante do encontro do grupo, a saúde poderia ser entendida como “a medida em que um indivíduo ou grupo é capaz, por um lado, de realizar aspirações e satisfazer necessidades e, por outro, de lidar com o meio ambiente. A saúde é, portanto, vista como um recurso para a vida diária, não o objetivo dela; é um conceito positivo que abrange recursos sociais e pessoais, bem como as capacidades físicas”.
Você concordaria com essa visão? Eu, particularmente, gosto muito! E costumo brincar com pacientes dizendo que saúde é mais ou menos como um salário.
Todos recebemos no começo da vida (alguns mais, outros menos). Quanto vai durar? Não sabemos exatamente, afinal a vida é cheia de surpresas. Mas vai depender, de certa forma, da maneira que gastamos (ou economizamos).
Não é possível guardar tudo – afinal é preciso consumir esse recurso para viver! Mas se usarmos com consciência, é bem possível que, com sorte, dure um pouco mais.
E assim chegamos a um outro aspecto interessante da saúde.
Diversos pesquisadores (vale mencionar a proposta dos Determinantes Sociais de Saúde, de Dahlgren e Whitehead) defendem que a saúde depende de inúmeros fatores. Genética, idade, gênero, contexto social e econômico (como moradia, acesso à educação, alimentação e serviços de saúde, entre outros). Bem óbvio, certo?
Acontece que temos pouca ou nenhuma chance de mudar alguns deles. O contexto social e econômico em nosso país, por exemplo, é marcado por profundas desigualdades e oferece chances restritas de mudança. Não podemos (ainda) mudar nossos genes para reduzir a chance de uma doença genética.
No entanto, sabe-se que nossa saúde é determinada, em grande parte, pelos nossos hábitos. E são fatores que podemos mudar! Alimentação, nível de atividade física, consumo de tabaco, álcool, drogas são alguns exemplos de condições determinantes de saúde que podem ser modificados. Alguns estudos sugerem que cerca de um terço da nossa saúde é determinada pelos hábitos de vida!
Concluindo… Como médico de família, acredito que, mais importante do que manter exames preventivos em dia, é simplesmente estarmos atentos aos nossos hábitos.
É preciso “gastar” esse recurso chamado saúde de forma muito consciente, dada a sua preciosidade. Desfrutar do incrível fato de ter saúde para viver – sem se esquecer, no entanto, de cuidar bem dela. Afinal, dar valor e cuidar daquilo que se tem é uma forma de felicidade.
Então, pense bem: o que tem feito para cuidar da sua saúde? Que tal aproveitar esse dia para recomeçar?
Gustavo Landsberg é Médico de Família e Comunidade (UFMG) com interesse especial por Tecnologia da Informação aplicada à Saúde. É mestre em Atenção Primária à Saúde (Universidad Autònoma de Barcelona) e autor do livro “Primária – o essencial da Atenção Primária à Saúde” e fundador da startup Canguru Gravidez.
Mais do que dar acesso a médicos e hospitais, a proposta da Sami é cuidar de você por inteiro, utilizando soluções integradas para elevar seu bem-estar e promover sua saúde de forma integral através de tratamento preventivo e coordenado.